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3 de abril de 2019

O que quer dizer quem afirma que o nazismo é de esquerda? por Érico Firmo

Até me constrange gastar papel com a discussão sobre se o nazismo é de esquerda. É um revisionismo contemporâneo, com muita força no Brasil, e que não tem objetivo de entender a história. A intenção é a disputa histórica do presente.

Um dos argumentos está no nome do partido nazista: Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães. Tá lá, socialista. Adolf Hitler falou sobre isso, em entrevista em 1923 a George Sylvester Viereck. "Socialismo é a ciência de lidar com o bem comum. Comunismo não é o socialismo. Marxismo não é socialismo. Os marxistas roubaram o termo e confundiram seu significado. Eu devo tirar o socialismo dos socialistas", disse Hitler. Tratava-se de uma visão, e uma disputa cultural, em torno da palavra socialista.

Disse mais: "O socialismo é uma instituição alemã, do arianismo antigo. Nossos ancestrais possuíam terras em comum. Cultivavam a ideia do bem comum. O marxismo não tem direito de se disfarçar de socialismo. O socialismo, ao contrário do marxismo, não repudia a propriedade privada. Ao contrário do marxismo, não envolve a negação da personalidade; em vez de marxista, ele é patriótico. Poderíamos nos chamar Partido Liberal".

Hitler admitia se chamar de liberal, mas seria outro falseamento. O nazismo não era liberal, assim como não era de esquerda.

Por que esse debate surge? Por que é dito que o nazismo é de esquerda? É uma disputa sobre o agora. Pretende-se usar o nazismo para desqualificar a esquerda de hoje. Há um subtexto aí de que, em última instância, a esquerda é nazista.

Posições ideológicas não são estanques. Direita e esquerda hoje não são o que eram na Revolução Francesa. Bem como conservadorismo e liberalismo não são o que eram no século XIX. Abraham Lincoln e Donald Trump não são a mesma coisa, apesar de integrarem o mesmo Partido Republicano. A noção do que é esquerda na América Latina não é igual à da Europa.

Nazismo não é de esquerda, não é liberal e não se confunde, também, com a direita tradicional. Conservadores não eram nazistas. Winston Churchill não era nazista - ninguém esteve mais longe disso.

Na Alemanha, não existe essa polêmica e a direita de lá nem cogita o negacionismo. O conservador Franz Josef Strauss, ex-governador da Baviera, dizia: "À direita da União não deve haver nenhum partido democraticamente legitimado". A União é a União Democrática Cristão, de Angela Merkel. A rejeição a qualquer coisa à direita disso está na perigosa proximidade com o nazismo.

O nazismo é fenômeno de exceção, difícil de enquadrar no espectro convencional. Como hipérbole, muitos políticos são taxados de nazistas. Isso vai de Bolsonaro até Cid Gomes (PDT). Um despropósito. Dizer que o nazismo é de esquerda ou usá-lo para atacar adversários políticos de hoje é raso, fruto, no mínimo, de conhecimento tacanho. Ou é só desonesto mesmo.

Publicado originalmente no portal O Povo Online

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