15 de janeiro de 2023

Democracia brasileira passa por novo teste

O prédio do Supremo Tribunal Federal visto através de uma janela quebrada do Palácio do Planalto (Foto: Mauro Pimentel)

A primeira semana de 2023 mal havia terminado quando a democracia brasileira foi novamente colocada à prova, desta vez com os atentados terroristas do dia 8 de janeiro, em Brasília. A ação partiu de um grupo extremista que existe, é danoso e mostrou que deve seguir como objeto de atenção das autoridades pelos próximos anos.

Parte da história recente brasileira, muitas vezes em forma de discursos, o extremismo havia registrado seu ápice nos atos antidemocráticos do 7 de Setembro de 2021. Na ocasião, eles pediam golpe de Estado, enquanto o então presidente Jair Bolsonaro (PL) discursava em tom de ameaça à democracia, incitando apoiadores contra a Justiça, sobretudo o Supremo Tribunal Federal (STF), e chamando as eleições de “farsa”.

Quando esses apoiadores do agora ex-presidente, derrotado democraticamente nas urnas, começaram a depredar e saquear prédios públicos, mais uma linha foi cruzada. As palavras de ameaça deram lugar a ações criminosas em larga escala. Surgiu a questão sobre os danos que o terrorismo pode causar e como a democracia pode reagir.

Iago Caubi, pesquisador ligado ao Núcleo de Pesquisa de Geopolítica, Integração Regional e Sistema Mundial (GIS-UFRJ), avalia que os ataques em Brasília são parte de um quadro de acirramento que deve permanecer no dia a dia do país.

“O extremismo exacerbado será parte do cotidiano nacional pelos próximos anos. Não é de hoje que caminhamos para o que aconteceu e se não nos cuidarmos poderá ser pior”, projeta.

Ele diz que os ataques em Brasília têm características similares a outros vistos pelo mundo, como no caso do Capitólio dos Estados Unidos, em 6 de janeiro de 2021, e que são “provavelmente influenciados e financiados” por pessoas ligadas a eixos políticos de cunho extremista. “É necessário um alinhamento dos três Poderes para de fato combater essa estrutura”, pontua.

As instituições responderam. Lideranças políticas e institucionais prometeram ações e investigações para encontrar e punir participantes e financiadores dos ataques. Dias depois, o saldo já era de 1,1 mil presos pela participação e o bloqueio, na Justiça, dos bens de dezenas de pessoas físicas e jurídicas acusadas de financiar os grupos. O total bloqueado chegava à casa dos R$ 6,5 milhões até a última sexta-feira, 13.

Na sociedade civil também houve repercussão. A caixa de e-mails de jornalistas viu uma avalanche de notas de repúdio dos mais variados segmentos. Entidades ligadas a magistrados, professores, advogados, médicos, profissionais dos transportes, do setor ptrolífero e da agropecuária foram algumas a se posicionar.

Para além dos números, o saldo dos ataques é o reconhecimento de que há grandes desafios pela frente. As instituições terão que combater um eixo autoritário que se alastrou pelo País e ganhou espaço no Parlamento. Da parte da população é necessário uma vigilante mobilização popular a favor da democracia.

“Ao meu ver, se trata de uma ameaça fascista. Se o governo contar com base popular e o apoio dos outros Poderes é possível mudar o cenário. Essa é a fortaleza que temos que construir: uma democracia autônoma e consciente, que consiga respeitar suas próprias escolhas e entender os interesses nacionais”, complementa Iago Caubi.

Na semana passada, mais um indício preocupante. A Polícia Federal encontrou uma minuta de decreto que previa instituir estado de defesa no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e dava poderes a Bolsonaro para interferir no resultado eleitoral.

O documento, achado na casa do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, lançou suspeitas de que pessoas no alto escalão do governo Bolsonaro flertaram com o golpe durante o processo eleitoral de 2022.

Torres negou a autoria do decreto, mas não sua existência. O ex-ministro disse que havia "uma pilha de documentos para descarte" em sua casa, alvo de busca e apreensão de agentes de segurança, e que tudo seria "levado para ser triturado oportunamente". Torres disse ainda que se deparava com "sugestões e propostas dos mais diversos tipos".

Exonerado do cargo de secretário da segurança do Distrito Federal após acusações de conivência com os atentados terroristas em Brasília, o ex-ministro terá mais fatos a explicar às autoridades.

Direitos humanos entram na pauta de bolsonaristas após prisões

Os desdobramentos do 8 de janeiro de 2023, data dos atos terroristas praticados em Brasília, fizeram com que pautas antes depreciadas por grupos bolsonaristas e pelo próprio ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ganhassem espaço nos discursos de lideranças políticas da extrema-direita e nas redes sociais.

Discussões sobre Direitos Humanos e as condições do sistema carcerário, antes diminuídas por Bolsonaro, tornaram-se tema de preocupação dos grupos. Ao todo, 1.167 pessoas haviam sido presas por conta dos atentados terroristas até a tarde da última sexta-feira, 13, segundo dados mais recentes divulgados pela Secretaria de Administração Penitenciária (Seape) do Distrito Federal.

Antes de serem encaminhados aos Centros de Detenção da Papuda (homens) e Colmeia (mulheres) os bolsonaristas ficaram alojados no ginásio da Polícia Federal, onde reclamaram das condições em que estavam.

A deputada federal bolsonarista Bia Kicis (PL-DF) chegou a compartilhar uma informação falsa sobre a suposta morte de uma idosa que estaria entre os detidos pela PF devido a falta de “comida e água” e maus-tratos. O que foi desmentido pela instituição e depois confirmado se tratar de uma mentira. Posteriormente a parlamentar se desculpou.

Um dos filhos do ex-presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) discursou durante sessão do Senado a favor das pessoas presas e referiu-se aos terroristas como “senhorinhas, idosos, pessoas com deficiência e crianças”. Embora tenha repudiado os atos terroristas, o ex-vice-presidente e senador eleito Hamilton Mourão (Republicanos-RS) também fez contestações.

Mourão discordou do termo “terrorismo” e afirmou que ocorria uma detenção indiscriminada de pessoas “confinadas em condições precárias nas instalações da PF”. As alegações de bolsonaristas foram desmentidas por órgãos como o Ministério Público Federal (MPF), que esteve no local para averiguação. “Nenhuma irregularidade foi constatada”, informou o MPF.

Além disso, o ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, divulgou nota na qual informou que a pasta mantinha contato com o Ministério da Justiça a fim de monitorar a situação das pessoas detidas.

Já encaminhados aos centros de detenção, os terroristas receberam doses de vacinas, dentre elas as contra a Covid-19, kit higiene e um colchão para dormir. Os bolsonaristas estão em alas separadas de outros detentos e têm ainda o direito a quatro refeições (café da manhã, almoço, café da tarde e jantar) e banho de sol diários.

Com informações portal O Povo Online

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