6 de agosto de 2025

Bolsonaristas radicalizam e levam a crise ao Congresso, por Luiz Carlos Azedo

 Parlamentares de oposição, liderados pelo PL, ocuparam as mesas diretoras da Câmara e do Senado (Foto: José Cruz)

A volta do recesso parlamentar, ontem, mostrou o agravamento da crise política que abala a República. A prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro, determinada pelo ministro Alexandre de Moraes por descumprimento de medidas cautelares, desencadeou reação imediata dos parlamentares de oposição, liderados pelo PL, que ocuparam as mesas diretoras da Câmara e do Senado, afrontaram seus presidentes, o deputado Hugo Mota (Republicanos-PB) e o senador Davi Alcolumbre (União-AP), e ainda ameaçam promover a obstrução total das votações do Congresso.

A cena de parlamentares impedindo o trabalho regular do Congresso não encontra paralelo recente na história. Mas ecoa o ambiente anárquico e radical que antecedeu a invasão dos palácios da Praça dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023, como se fosse a retomada de um fio da história da tentativa de golpe de Estado. Ao decretar a prisão domiciliar de Bolsonaro, Moraes tirou da garrafa o gênio da desestabilização das relações entre o Supremo Tribunal Federal e o Congresso.

Com a maior bancada da Câmara, o PL protagoniza a tentativa de emparedamento de Motta e Alcolumbre, para que ponham em votação, nesta semana, a anistia ao ex-presidente e aos demais envolvidos na tentativa de golpe de 8 de Janeiro, na Câmara, e o impeachment de Moraes, no Senado, onde já há 35 das 41 assinaturas de senadores necessárias para impor esta pauta.

Considerada desnecessária e exagerada por setores da magistratura, inclusive alguns ministros do STF, a prisão domiciliar de Bolsonaro foi uma resposta aos ataques que a Corte vem sofrendo por parte da oposição e ao descumprimento de medidas cautelares aplicadas ao ex-presidente, como participar de manifestações físicas ou virtuais. Mas fragilizou o amplo apoio que o julgamento do ex-presidente vinha tendo do Centrão e de setores moderados da oposição.

Essa fratura facilitou a ofensiva coordenada pelos senadores Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e Rogério Marinho (PL-RN), líder da oposição no Senado, e pelos deputados Sóstenes Cavalcanti (RJ), líder do PL, e Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que está nos Estados Unidos, onde articulou a adoção pelo presidente Donald Trump do tarifaço de 50% sobre produtos brasileiros.

Há um realinhamento de forças políticas no país em razão da intervenção direta de Trump em favor de Bolsonaro. Desde o golpe militar de 1964, que foi vitorioso, não ocorre uma interferência dos Estados Unidos dessa magnitude na política brasileira, em apoio aberto ao ex-presidente, seus filhos e seus aliados. Não tem precedentes a forma como o tarifaço de 50% sobre produtos brasileiros está sendo comemorado por Bolsonaro e a bancada do PL, como um golpe para desestabilizar o governo Lula e impor ao Supremo uma decisão favorável ao ex-presidente.

Paralelo histórico

Nem de longe as medidas do STF têm paralelo, por exemplo, embora de natureza ideologicamente oposta, com a cassação do registro do Partido Comunista Brasileiro (PCB), em 1947, após declarações de seu secretário-geral, Luiz Carlos Prestes, no ano anterior. A Guerra Fria dava seus primeiros passos. O Brasil, recém-saído da ditadura Vargas e com uma Constituição democrática em vigor, vivia um momento de intensa disputa ideológica. Nesse contexto, respondendo a uma pergunta hipotética e capciosa, Prestes afirmou: "Se houver guerra entre o Brasil e a União Soviética, estarei ao lado da União Soviética".

Interpretada como prova de lealdade a uma potência estrangeira, a frase caiu como uma bomba no Congresso e na opinião pública. O governo Dutra, alinhado aos EUA, reagiu com rapidez: o PCB foi acusado de agir contra a segurança nacional. Em 1947, seu registro foi cassado e, em seguida, seus parlamentares perderam o mandato. O partido mergulhou na clandestinidade e a repressão contra seus militantes se intensificou. Somente em 1985, no governo Sarney, o PCB voltou a ser um partido legal.

O "sincericídio" de Prestes, embora coerente com sua ideologia, foi usado historicamente como argumento para justificar uma medida drástica de exclusão política. A lógica era: uma força que age em sintonia com interesses estrangeiros contra o próprio país não pode permanecer no jogo democrático. Oito décadas depois, o paralelo não está na ideologia, mas no caráter da ação política: a atuação contra a soberania nacional e as instituições democráticas.

Bolsonaro e seus filhos estimulam, de forma aberta, que Trump imponha sanções e tarifas contra o Brasil para constranger o Judiciário e obter vantagens políticas internas. Em momento de grave tensão diplomática, porém, a reação do Supremo nem de longe se compara àquela aplicada ao PCB. O paralelo somente tem sentido para mostrar que certos limites constitucionais estão sendo ultrapassados, em embargo das críticas às medidas cautelares adotadas por Moraes.

Alcolumbre classificou a ação de ontem como "exercício arbitrário das próprias razões", lembrando que o Congresso tem "obrigações com o país" na apreciação de matérias essenciais. Motta adotou tom mais neutro, mas reforçou que decisões judiciais devem ser cumpridas. Ambos, porém, enfrentam o mesmo dilema: como retomar os trabalhos sem ceder à chantagem política.

Publicado originalmente no Correio Braziliense

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