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O ministro Alexandre de Moraes concedeu entrevista ao jornal americano The Washington Post (Foto: Fellipe Sampaio) |
Em entrevista ao jornal The Washington Post, da capital dos Estados Unidos, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, deixou claro que não vai recuar de suas decisões sobre Jair Bolsonaro, réu no STF por tentativa de golpe de Estado. Um aviso direto ao presidente Donald Trump, que vem tentando influenciar no julgamento do ex-presidente. A perseguição ao magistrado começou com a imposição de sanções comerciais de 50% a parte das exportações brasileiras para os EUA. Prosseguiu ao cassar-lhe o visto de entrada no país e, na sequência, ao enquadrá-lo na lista dos atingidos pela Lei Magnitsky — que bloqueia bens e ativos em território norte-americano e impõe uma série de restrições bancárias.
"Não existe a menor possibilidade de recuar nem um milímetro sequer. Faremos o que é certo: receberemos a acusação, analisaremos as provas e quem deve ser condenado será condenado, e quem deve ser absolvido será absolvido", garantiu o ministro.
Na reportagem, o ministro afirmou que sempre buscou inspiração na história da governança norte-americana, discorrendo sobre as obras de John Jay, Thomas Jefferson e James Madison. "Todo constitucionalista tem uma grande admiração pelos Estados Unidos", observou.
Moraes afirmou que o Brasil e os EUA eram amigos e admitiu que acreditava que o crescente abismo entre eles era temporário, impulsionado pela política e pelo tipo de desinformação que ele passou anos tentando reprimir. O ministro citou o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que lidera uma campanha de hostilidades dos EUA contra o Brasil e se diz responsável pelas sanções contra o magistrado.
"Essas narrativas falsas acabaram envenenando a relação — narrativas falsas apoiadas pela desinformação espalhada por essas pessoas nas redes sociais. Então, o que precisamos fazer, e o que o Brasil está fazendo, é esclarecer as coisas", disse.
O jornal norte-americano citou o fato de que, mesmo com as sanções impostas por Trump, a Primeira Turma do STF marcou o julgamento de Bolsonaro e de outros acusados de tentar um golpe de Estado para começar em 2 de setembro. O The Washington Post, inclusive, utilizou uma expressão para classificar Moraes: "xerife da democracia".
Na entrevista, o ministro atribui ao fato de que os EUA jamais estiveram sob uma ditadura a não compreensão das medidas tomadas pela Justiça brasileira contra Bolsonaro e outros acusados de tramar um golpe. "Entendo que, para uma cultura americana, seja mais difícil compreender a fragilidade da democracia porque nunca houve um golpe lá. Mas o Brasil teve anos de ditadura sob o [presidente Getúlio] Vargas, outros 20 anos de ditadura militar e inúmeras tentativas de golpe. Quando você é muito mais atacado por uma doença, forma anticorpos mais fortes e busca uma vacina preventiva", explicou.
Questionado sobre a perda de liberdades pessoais e restrições de viagem impostas a ele pelo governo nortre-americano, Moraes respondeu que "isso não é agradável de passar". Mas, conforme observou, o Brasil estava contra forças poderosas que queriam desfazer a democracia, e era seu trabalho detê-las. "Enquanto houver necessidade, a investigação continuará", concluiu.
A reportagem do Washington Post relata como Moraes saiu "de uma origem comum na classe média para se tornar o jurista mais poderoso da história do Brasil". Menciona, também, como o ministro assumiu a relatoria do inquérito das fake news, no início de 2019, a pedido de Dias Toffoli, então presidente do STF.
Diante
da repercussão da entrevista do ministro, a Embaixada dos Estados Unidos no
Brasil classificou o ministro de "tóxico para todas as empresas legítimas
e indivíduos que buscam acesso aos Estados Unidos e seus mercados".
"Alexandre de Moraes é tóxico para todas as empresas legítimas e
indivíduos que buscam acesso aos Estados Unidos e seus mercados. Nenhum
tribunal estrangeiro pode anular as sanções impostas pelos EUA ou proteger
alguém das severas consequências de descumpri-las. Cidadãos americanos estão
proibidos de manter qualquer relação comercial com ele. Já cidadãos de outros
países devem agir com cautela: quem oferecer apoio material a violadores de
direitos humanos também pode ser alvo de sanções", publicou o perfil
oficial da representação no X (antigo Twitter), na noite de ontem. A
manifestação da embaixada também criticou a decisão do ministro Flavio Dino, do
STF, em anular a validade no Brasil de decisões judiciais tomadas em outro
país.
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Capa do jornal americano The Washington Post |
MRE contesta os EUA
Já o Ministério das Relações Exteriores (MRE) contestou as alegações feitas pelos Estados Unidos de que práticas como o Pix seriam "desleais" e capazes de prejudicar o funcionamento de empresas norte-americanas. Essas pontuações foram feitas em julho pelos EUA por meio do Escritório do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR), com base na Seção 301 da Lei de Comércio dos Estados Unidos, de 1974. Além do Pix, os EUA alegam que o Brasil seria "leviano" com o combate ao desmatamento, à corrupção e na proteção da propriedade intelectual. A apuração com base na norma do governo norte-americano prevê consultas diplomáticas, além de uma audiência pública marcada para 3 de setembro, em Washington.
Segundo o comunicado do MRE, foram enviados aos EUA documentos que comprovam que as "políticas brasileiras investigadas são transparentes, não discriminatórias, estão em plena conformidade com as melhores práticas internacionais e com as obrigações do país na OMC (Organização Mundial do Comércio)". A nota reitera que o Brasil não reconhece a legitimidade de investigações baseadas na Seção 301, "que são inconsistentes com as regras e o sistema de solução de controvérsias da OMC".
"A participação brasileira no processo se dá em espírito de diálogo e de esclarecimento de fatos e não constitui reconhecimento da validade ou jurisdição do procedimento", salienta o MRE
Publicado
originalmente no Correio Braziliense
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