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Em visita a Belém, Lula destacou que as obras da COP 30 deixam um legado que vai além dos dias da conferência (Foto: Ricardo Stuckert) |
Na última semana. o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) desembarcou em Belém, capital do Pará, para uma série de inaugurações de obras estruturantes e entregas vinculadas à preparação da cidade para a COP30, principal evento internacional sobre sustentabilidade e meio ambiente.
Em meio às críticas de delegações internacionais sobre a falta de estrutura cidade, Lula argumenta que os estrangeiros devem ver a região amazônica como ela é, e que os investimentos realizados para a COP vão beneficiar Belém no longo prazo. Porém, o otimismo do presidente pode gerar descrédito caso as promessas não sejam cumpridas
A agenda e Belém, que também incluiu uma visita ao arquipélago do Marajó, marca uma etapa simbólica da estratégia do governo federal de transformar a COP em um marco de requalificação urbana e reposicionamento político do Brasil no debate climático internacional.
Durante a visita, Lula destacou que as obras fazem parte de um projeto de legado que vai além dos dias da conferência. O presidente afirmou que as intervenções — que incluem ações de saneamento, mobilidade e infraestrutura viária — pretendem melhorar a qualidade de vida da população e deixar um impacto duradouro na cidade.
"Belém será, durante a COP, o centro do mundo. Mas o mais importante é que continue sendo uma cidade melhor para o seu povo depois que as luzes do evento se apagarem", disse o presidente, em discurso durante uma das inaugurações.
Durante os dois dias em que esteve no Pará, quinta e sexta passadas, o petista inaugurou creches e anunciou novas obras da educação, visitou o recém-criado Museu das Amazônias e o Parque da Cidade, onde a maior parte dos eventos ligados à COP, incluindo a reunião de chefes de Estado, ocorrerá. Ao todo, o investimento em obras de infraestrutura chega a R$ 6 bilhões.
Apesar do tom otimista do governo, especialistas avaliam que a visita de Lula tem também um forte componente simbólico. Para o cientista político Márcio Coimbra, o ato presidencial em Belém "possui um caráter essencialmente político e midiático, funcionando mais como um paliativo de imagem do que como um indicativo de eficácia na gestão das obras".
Segundo ele, o governo federal e o governo do Pará buscam projetar uma narrativa de comprometimento com a infraestrutura e a agenda ambiental, mas enfrentam o desafio histórico da falta de investimentos consistentes na região Norte.
"A escolha de Belém como sede da COP30 é, em tese, uma oportunidade para o Brasil reafirmar seu protagonismo nas discussões climáticas. Porém, a visita presidencial evidencia a defasagem crônica de investimentos na cidade", analisa.
Visita
estratégica
Lula, por sua vez, tem reforçado que o cronograma de obras está em andamento e que a união entre as esferas federal, estadual e municipal é essencial para garantir a entrega das principais intervenções até o início da conferência, realizada entre os dias 10 e 21 de novembro.
Entre as prioridades estão os projetos de requalificação da orla de Belém, a ampliação da rede de drenagem e saneamento e a melhoria do sistema de transporte público. O governo argumenta que essas ações fazem parte de uma visão mais ampla de desenvolvimento sustentável para a Amazônia, integrando a pauta climática com políticas de combate à desigualdade social.
Entretanto, como observa Coimbra, há um risco político inerente à exposição do governo nesse contexto. "Visitas presidenciais, especialmente em momentos que antecedem grandes eventos internacionais, são estratégias conhecidas de marketing político.
O governo busca associar a imagem do presidente à realização de grandes obras e eventos, criando a percepção de competência e liderança", afirma o cientista.
Efeito
limitado
Ele pondera, contudo, que esse tipo de ação pode ter efeito limitado: "A curto prazo, gera manchetes positivas e melhora a percepção pública. Mas, se as promessas não se concretizarem, o resultado pode ser o oposto, alimentando o descrédito da população e da comunidade internacional".
Em meio ao entusiasmo oficial e às críticas sobre o ritmo das intervenções, Belém se prepara para receber, em novembro, mais de 30 mil visitantes de cerca de 190 países.
A cidade será palco de debates sobre descarbonização, financiamento climático e proteção de florestas tropicais — temas centrais para o governo brasileiro, que busca reposicionar o país como liderança ambiental após anos de retrocessos.
No entanto, o desafio de compatibilizar o discurso ambientalista com a realidade urbana e social da Amazônia continua a ser o principal ponto de tensão.
Para Márcio Coimbra, as expectativas em torno da COP30 "são ambiciosas, mas permeadas de ceticismo". Segundo ele, o evento é uma oportunidade de o Brasil retomar protagonismo no cenário internacional e de a região amazônica atrair investimentos em desenvolvimento sustentável.
"A escolha de Belém simboliza a importância de discutir o clima a partir de um território-chave para o equilíbrio ambiental do planeta", destaca. Mas o cientista alerta para os riscos de o país não corresponder às próprias promessas, feitas, inclusive, em fóruns mundiais.
"Há um temor de que a COP30 seja marcada por contradições. Se o governo não conseguir conter o desmatamento e não entregar melhorias urbanas significativas, o evento pode se tornar um palco de constrangimento — um contraste entre o discurso global e a realidade local".
O Palácio do Planalto aposta em deixar um legado de credibilidade ambiental e transformação social, reforçando que o Brasil quer liderar, de forma concreta, a transição verde mundial. Para isso, a execução das obras em Belém e a articulação política nas semanas que antecedem a COP serão decisivas.
Entre
a diplomacia e o canteiro de obras, o governo tenta equilibrar o simbolismo
político com resultados tangíveis — numa equação em que o sucesso da COP30
poderá definir, em grande parte, a imagem do país e do próprio presidente Lula
no cenário global.
Publicado
originalmente no Correio Braziliense
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