19 de novembro de 2025

Criminalidade não se combate com grito e valentia, por Érico Firmo

Sessão na Câmara: relator apresentou seis versões do texto ao longo de duas semanas, a última pouco antes do debate em plenário (Foto: Bruno Spada)

Segurança pública é uma área particularmente complexa no poder público. Claro que educação e saúde são tremendamente intrincadas e desafiadoras. Mas, pelo menos em tese, não há ninguém trabalhando contra. Em princípio, não há um agente contra a qualidade da educação, alguém que não queira que as pessoas tenham bom atendimento na rede hospitalar. Na teoria. Já a segurança pública lida com adversários — e eles estão cada vez mais organizados.

A segurança exige planejamento, estratégia, financiamento e qualificação. Há alguns princípios muito repetidos, porque óbvios, a ponto de se tornarem chavões: inteligência, tecnologia e estrangulamento financeiro do crime. Porém, não é possível ficar no generalismo. Como escrevi ontem, prometer solução simples, rápida e fácil é vender ilusões.

Um subproduto do oportunismo político é o político que grita, diz que prende e arrebenta. Dá tapa na mesa e promete dar jeito porque é valente. Espécimes desses estão por aí há pelo menos 40 anos. Nunca resolveram nada em lugar nenhum. Mas muitos se elegeram e se reelegeram com esses discursos. Só deram jeito nas próprias vidas.

Salvo os não poucos oportunistas aos quais me referi ontem, chego a ver singeleza no pensamento rudimentar de quem acha mesmo que vai melhorar alguma coisa na base da ignorância, porque é muito macho. A força e a truculência podem atender aos instintos primitivos, mas o problema da violência exige elaboração sofisticada e sutil. Demanda unir o conhecimento prático aos estudos teóricos.

O Rio de Janeiro foi, recentemente, exemplo de uma operação com extrema mortandade, incapaz de alcançar o resultado esperado. O Ceará tem feito abordagem que resulta em alta da mortalidade em ações policiais. Daqui a um ano vejamos quão seguros estarão esses lugares.

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), hoje em prisão domiciliar, tinha uma resposta simplória para defender a morte de criminosos: nunca nenhum voltou para cometer roubar ou matar, ele dizia. É verdade. Mas entra outro no lugar e cumpre o mesmo papel.

Diferentemente do que supõe um raciocínio tão rústico quanto difundido, as pessoas não cometem crimes sistemáticos por maldade. O crime organizado é negócio. Enquanto é lucrativo e vantajoso, irá recrutar gente. Desconheço que já tenha havido escassez de mão de obra. Se um é morto, outro entrará no lugar. A brutalidade como política de segurança apenas leva mais gente para as facções, para substituírem os mortos.

O desafio fundamental

Um dos debates que se tornaram centrais no projeto antifacções foi a equiparação ou não a terrorismo. Até o momento em que escrevia esta coluna não havia desfecho. Pesquisa mostrou que a população é muito simpática à ideia, apesar de ser um equívoco de conceitos.

As pessoas acham que a solução é gritar: “Isso é muito grave”, “isso é “terrorismo”. Há bastante tempo, tenta-se coibir várias modalidades de ilegalidade com penas cada vez mais duras e extremas. Por mais que tenha sucessivamente fracassado, vá lá que se queira aumentar as penas. Mas o problema é mais embaixo.

Grandes chefes do facções no Brasil já estão encarcerados, mas seguem a comandar ações criminosas de dentro das prisões. Essa é a questão mais urgente. Antes de definir se a pena será maior, se o membro de facção é terrorista, o urgente é garantir que o indivíduo que está preso não continuará a, lá de dentro, ordenar crimes cometidos do lado de fora. O estágio é bastante elementar.

Publicado originalmente no portal O Povo +

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