4 de setembro de 2025

A melhor parte do julgamento no STF, por Érico Firmo

Foram concluídas sustentações orais das defesas dos réus por tentativa de golpe de Estado (Foto: Rosinei Coutinho)

Acompanhar o julgamento da ação penal 2668 no Supremo Tribunal Federal (STF) é um exercício interessante. Se observado para além de torcidas por um lado ou outro, é juridicamente rico. Estão ali alguns dos maiores advogados do Brasil. O embate com o procurador-geral da República, Paulo Gonet, e as teses, as argumentações formuladas, são estimulantes.

Há aspectos que chamam atenção, como o general Braga Netto ser defendido por José Luiz Mendes de Oliveira Lima, o advogado de José Dirceu no mensalão. E chega a ser insólito acompanhar Demóstenes Torres, ex-senador cassado por acusação de vínculo com o bicheiro Carlinhos Cachoeira, ao contar causos enquanto faz a defesa do almirante Almir Garnier.

O melhor de tudo é ver que os duros questionamentos ocorrem em ambiente de respeito e normalidade democrática. A denúncia de Gonet foi criticada com energia. A atuação de Alexandre de Moraes foi questionada de forma incisiva. Mas nem de longe ao modo do clã Bolsonaro, do conspiracionismo lesa-pátria, ou como no ambiente Legislativo, onde é dito que o Brasil é uma ditadura.

Existem posições divergentes e elas são tratadas no âmbito das instituições. Com muita transparência, com julgamento acompanhado ao vivo no Brasil e no Exterior, tudo às claras. Uma decisão será tomada e haverá insatisfeitos, que terão os espaços para questionamento. Na institucionalidade, não pela força, pelo grito, pela pressão ilegítima, na marra.

É assim a democracia. As decisões são tomadas dentro das regras e das instituições. Mas nada garante que serão conforme se deseja. O regime no qual se tem certeza que a vontade irá prevalecer se chama ditadura e essa vontade é a do ditador.

Argumentos

A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) era, naturalmente, a mais aguardada. Dividiram-se na sustentação Celso Vilardi e Paulo Amador da Cunha Bueno. Quase todo o tempo foi usado pelo primeiro, numa argumentação sólida e consistente. Concentrou-se principalmente na parte processual. Questionou a delação de Mauro Cid e o prazo dado à defesa, além de apontar vícios na produção de provas. Bueno tratou das denúncias propriamente ditas. Nesse ponto — não falo do aspecto jurídico, mas político e jornalístico — foi pouco convincente, para não dizer sonso.

Em dado momento indagou: “Reunião com comandantes de Forças onde se discutiram mecanismos constitucionais é um ato de força ou de grave ameaça?” Depende do que estavam discutindo. Se foi para decretar estado de sítio porque perdeu a eleição, usando como justificativa a instabilidade produzida pelos próprios apoiadores, com objetivo de ter poderes de exceção como parte de uma trama para impedir a posse do governo eleito, isso é sim ato de força ou grave ameaça. É muito crime e muito golpe.

Simples troca

Bueno prosseguiu ao afirmar que não é verdade que o golpe deixou de ocorrer porque os comandantes militares não concordaram. Ele faz um raciocínio tão simplório que se torna obtuso. Se assim quisesse, ele falou, Bolsonaro teria substituído aqueles que não concordaram com o plano. O advogado parece zombar da inteligência alheia. Se, a semanas de deixar o cargo, o ex-presidente substituísse os chefes das Forças, seria escancarar para a sociedade que havia algo de muito anormal. Ainda mais com a agitação em curso. Era caso de ser preso em flagrante, ainda mais pelos que fossem demitidos depois de lhes ter proposto um golpe.

Além do mais, imaginar que novos comandantes iriam cair de paraquedas e já liderar um levante contra a ordem constitucional é fazer um juízo sobre as Forças Armadas que é demais até para a história militar brasileira.

Sinais de Bolsonaro

Bueno foi mais longe. Sobre a postura de Bolsonaro após encontrar os chefes das Forças, ele disse: “Os atos posteriores do presidente foram totalmente voltados a desestimular seus apoiadores e seus eleitores a qualquer forma de não reconhecimento da vitória eleitoral do presidente Lula”. Já tinha sido demais, mas o advogado foi além. O homem nunca reconheceu a derrota. Foi para os Estados Unidos para não passar a faixa. Se tivesse pedido para reconhecerem o resultado eleitoral e irem para casa, tudo teria cessado e o 8 de janeiro e atos relacionados jamais teriam ocorrido. Ele se omitiu e fez mais que isso.

Publicado originalmente no portal O Povo +

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