11 de setembro de 2025

Divergência do ministro Luiz Fux na trama golpista aprofunda polarização política

Nas redes sociais, a extrema-direita comemorou o voto de Fux (Foto: Victor Piemonte)

O voto do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ação penal da trama golpista, serviu para aprofundar a polarização política e social. Se, de um lado, agradou aos advogados dos réus e foi exaltado pelos bolsonaristas, no Congresso e nas redes sociais, de outro mereceu críticas nos bastidores do STF e levou os governistas a enfatizarem que tal divergência desmonta a narrativa da extrema-direita de que há uma "ditadura da toga" no país.

Para Celso Vilardi, que coordena a defesa de Jair Bolsonaro — absolvido pelo ministro de todas as acusações —, Fux "lavou a alma", pois, segundo ele, trata-se de uma vitória processual. "O voto acolheu, na íntegra, a tese da defesa. Foi absolutamente técnico e analisou as provas de maneira exaustiva", explicou.

O advogado destacou o reconhecimento, no voto, da dificuldade de acesso às provas. "Fiquei feliz porque o ministro tratou o acesso a documentos como fundamental, algo já pacificado pela jurisprudência do STF", observou, reiterando que Bolsonaro não participou da trama golpista. "Se prevalecer a tese da denúncia, seriam meros atos preparatórios, sem caráter de execução", sustentou.

Na visão de Paulo da Cunha Bueno, outro advogado de Bolsonaro, o voto de Fux "entra para a história". "Faz jus à reputação do ministro — um ministro de carreira, professor titular. É um voto comprometido, só e tão somente, com a boa técnica jurídica", afirmou, ao sair do STF, antes mesmo do término da leitura de Fux.

Os advogados do tenente-coronel Mauro Cid definiram a manifestação do ministro — que condenou o militar apenas por tentativa de abolição violenta do Estado de Direito — como "muito além das expectativas". Isso porque trabalhavam com a hipótese de que o ministro condenaria todos os réus, mas pediria penas mais baixas que as dos demais integrantes da Primeira Turma.

José Luís Oliveira, que representa o general Walter Braga Netto — condenado somente por tentativa de abolição violenta do Estado de Direito —, salientou que o voto de Fux chama a atenção para "uma questão fundamental, que é a incompetência do STF, ou da Primeira Turma, para julgar este processo. Isso macula o voto". O defensor advertiu, ainda, sobre o suposto cerceamento de defesa observado pelo ministro.

"Disse isso da tribuna: não tivemos acesso integral aos autos. Recebemos cópia em junho e, depois, em julho, o que torna impossível garantir plenamente o direito de defesa. Mas precisamos aguardar até o fim. Um voto isolado tem impacto reduzido, pode mexer na questão da pena, mas não define o quadro. Isso aqui não é uma prova de 100 metros, é uma maratona. Hoje está sol, amanhã pode chover", desconfia.

Já o advogado Matheus Milanez, que representa o general da reserva Augusto Heleno — absolvido por Fux de todas as acusações —, afirmou que a decisão fortalece a tese da incompetência do STF e do cerceamento de defesa. "Pela literalidade da Constituição, terminado o mandato (executivo ou legislativo), a competência desce para o primeiro grau. Vamos ver como os demais ministros se posicionam", avaliou, acrescentando que, se reconhecida menor participação na trama, Heleno teria direito a redução de pena.

Comemoração

Nas redes sociais, os bolsonaristas comemoraram o voto de Fux. O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) publicou que o ministro "nada mais está fazendo do que sendo juiz! Ao falar o óbvio, choca a assessoria de imprensa de Lula, que entende que os fins justificam os meios: se é contra Bolsonaro, vale tudo, inclusive torturar a lei e a Constituição. Fux honra a toga", publicou no X (antigo Twitter).

O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) também repercutiu a decisão: "O Supremo Tribunal não é competente para julgar o caso. Não foi assegurado o direito à ampla defesa. Não há provas de que os vândalos tenham agido sob ordem ou orientação direta do ex-presidente", postou, igualmente, no X.

Quem também se manifestou foi o relator da CPMI do INSS, o deputado bolsonarista Alfredo Gaspar (União Brasil-AL), sobre a decisão de Fux em suspender a ação penal contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ): "O ministro acolheu a minha tese, defendida em abril, quando atuei como relator do pedido de sustação da ação penal contra o deputado Delegado Ramagem", publicou o parlamentar, que é ex-promotor de Justiça.

Na Câmara dos Deputados, os bolsonaristas exultaram com Fux. A deputada Bia Kicis (PL-DF) classificou a posição do ministro como a de um "juiz imparcial". "O voto do ministro desmontou todo o teatrinho criado e protagonizado pelo Alexandre de Moraes e acompanhado pelo ministro (Flávio) Dino. Eles odeiam o Bolsonaro", festejou.

O deputado Cabo Gilberto (PL-PB) também exaltou a manifestação do magistrado. Segundo ele, a decisão reafirma os limites constitucionais do Supremo. "Fux foi muito sábio, honrou a toga. Não é porque beneficia o Bolsonaro, mas porque defende a Constituição e o devido processo legal", frisou.

Sem alterações

Entre os governistas, porém, prevaleceu o entendimento de que a divergência de Fux não altera a gravidade das acusações. A deputada Erika Kokay (PT-DF) disse que a tentativa de golpe de Estado precisa ser punida com rigor. A deputada Maria do Rosário (PT-RS) também reforçou a necessidade de responsabilização, mas ponderou que a divergência confirma a lisura do processo. "A discordância do ministro era previsível. Só comprova, inclusive para aqueles que estão atacando o Brasil, que o julgamento é livre, justo e houve direito de defesa", afirmou, citando o presidente norte-americano Donald Trump, que disse várias vezes que o processo da trama golpista é uma perseguição a Bolsonaro.

Para o deputado Rogério Correia (PT-MG), que acompanhou o julgamento no STF, a divergência de Fux confirma que o julgamento é justo. "A dissonância com o voto do relator mostra que houve pleno direito de defesa", observou, acrescentando que o voto divergente, por enquanto, não impacta o objetivo de condenar Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado.

O deputado Ivan Valente (PSol-SP) classificou a manifestação de Fux de "cínica" e "contraditória". Na visão do líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), a longa manifestação do ministro é "decepcionante" e perigosa para a democracia.

"É um voto que não se sustenta diante das provas e que acaba alimentando a narrativa dos bolsonaristas de que não houve golpe. Ele desrespeita os colegas do Supremo e a própria democracia brasileira", salientou, acrescentando que a decisão do ministro apenas serve para dar fôlego à extrema-direita.

Publicado originalmente no Correio Braziliense

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