25 de agosto de 2019

Especialistas explicam o que acontece com a Amazônia

Um dos focos da queimada na Amazônia no Estado de Rodonia (Foto: Corpo de Bombeiros-RO)
Nesta semana, os olhos do mundo se voltaram para a Amazônia, após um aumento significativo do número de queimadas na região em relação aos últimos anos. Os dados, somados à polêmica criada pelo governo, semanas atrás, em relação ao desmatamento na região, fizeram com que a destruição da floresta se tornasse uma preocupação não só no Brasil – onde o presidente Jair Bolsonaro chegou a ser alvo de panelaços na sexta-feira.

Depois de Noruega e Alemanha anunciarem, na semana passada, o corte dos recursos que destinavam ao Fundo Amazônia, criado em 2008 para financiar ações de preservação do bioma, o presidente francês, Emmanuel Macron, disse que a floresta seria um dos temas da reunião do G7 neste fim de semana. O presidente Bolsonaro reagiu à fala do francês, a quem acusou ter "mentalidade colonialista", mas também agiu internamente, criando um gabinete para conter a crise e anunciando o envio das Forças Armadas para combater o fogo nos estados que solicitarem ajuda.

Ainda assim, Bolsonaro procurou minimizar a gravidade da situação, ressaltando que o número de queimadas na região este ano está dentro da média dos últimos 15 anos. O dado do presidente está correto, segundo o Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (Inpe), o órgão cujos dados foram questionados pelo governo, o que provocou a demissão de seu presidente, Ricardo Galvão. No site do Inpe, vê-se que a região, nos meses de julho, apresenta uma média de 34.431 focos de queimada. Em julho passado, sétimo mês de governo Bolsonaro, foram registrados 30.922.

Sinais preocupantes
O problema, apontam especialistas em preservação ambiental, é que, quando se compara com os últimos anos, o início do governo Bolsonaro mostra uma preocupante tendência de elevação tanto das queimadas quanto do desmatamento. Desde 2012 que a Amazônia não registrava tantos focos de incêndio em julho quanto neste ano. Além disso, entre janeiro e 21 de agosto, o Inpe registrou 75.336 focos de incêndio no Brasil. O número é 84% maior que o observado no mesmo período de 2018. E, em relação ao desmatamento, o Inpe também apresentou uma tendência de aumento, justamente o que motivou a troca de comando do órgão.

Especialistas ouvidos pelo Correio dizem que esses dados são o primeiro resultado da política ambiental do governo Bolsonaro, que, por meio do afrouxamento da fiscalização, estimula a degradação da vegetação. Pós-doutor em economia e meio ambiente e professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), André Cutrim diz que grupos locais, que antes se sentiam intimidados com a fiscalização, agora pressionam a fronteira florestal.

"Quando o presidente visita a região e manda um recado para os fiscalizadores ambientais, dizendo que eles, por exemplo, não podem queimar os tratores de desmatamento mesmo que isso seja previsto por lei, há um recado para os grupos locais também. Ele basicamente diz que, se houver desmatamento na região, não haverá punição", afirma Cutrim. "Para essas pessoas, não há qualquer tipo de perspectiva de punição", acrescenta.

Um exemplo do que diz Cutrim ocorreu em 5 de agosto, quando fazendeiros paraenses realizaram o "Dia do Fogo". Segundo foi noticiado na imprensa local, os produtores disseram que coordenaram as queimadas para "mostrar ao presidente" que querem trabalhar.

Crise internacional
Os sinais que o governo brasileiro envia à comunidade internacional é outra fonte de preocupação. Quando se mostrou empenhado a reduzir os índices de desmatamento, o governo brasileiro contou com o respeito e o apoio, inclusive financeiro, de outros países. O Fundo Amazônia, criado em 2008 e cortado agora por Alemanha e Noruega, ajudou o Brasil a alcançar o menor índice de desmatamento anual de sua história quatro anos depois, em 2012.

O receio dos ambientalistas é que o atual governo ponha a perder um trabalho de décadas, realizado por vários governos. Desde 1988, quando o Inpe passou a contabilizar os dados, o desmatamento anual oscilava muito. Nos anos 2000, porém, esses números saíram de uma média de 18,2 mil km² desmatados por ano e ultrapassaram a casa do 20 mil km², chegando a 27,8 mil km² em 2004.

"Houve, então, pressão internacional. E começou a ter uma queda quando entraram os mecanismos de gestão ambiental, como fiscalização, rastreabilidade da cadeia bovina e conscientização do produtor agrícola, que entendeu ser possível desenvolver ganhos econômicos sem derrubar a floresta", conta Cutrim. 

A partir de 2004, os dados do desmatamento começaram a cair ano após ano, até chegar, em 2007, a 11,7 mil km². O número voltou a oscilar em 2008, ano em que se deu início ao Fundo Amazônia. A tendência de queda foi retomada, até que se chegou, em 2012, a 4,6 mil km². Desde 2015, porém, os números voltaram a crescer, e o temor é que patamares muito altos de desmatamento voltem a ser registrados.

Enquanto o desmatamento cresceu, em junho, 66%, no mês seguinte, esse percentual aumentou para 278%, em comparação com o mesmo período de 2018, segundo o Inpe. Foram esses dados – que o governo contesta, mas não apresenta outra medição – que levaram à demissão de Galvão e a declarações polêmicas de Bolsonaro, como a de culpar ONGs pelas críticas e a de dizer que a Alemanha podia pegar o dinheiro do fundo para recuperar as próprias florestas. 

Para Luiz Marques, professor do Departamento de História da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), tais argumentos não se sustentam. Segundo ele, a Europa passou por um processo de desmatamento, mas "ao longo de três mil anos". "Foi um processo lento e de expansão da civilização. Nós destruímos a nossa em 50 anos. E com esses incêndios, é capaz que tenhamos números maiores. As pessoas acham que isso não tem consequências para a água, para a biodiversidade, a segurança alimentar? É preciso ser muito louco para não entender um fato desses", diz. 

A crítica às ONGs também parecem infundadas, para Marques. "Você acha que tem alguma possibilidade de o Greenpeace, por exemplo, estar pondo fogo na floresta? Eles só não querem acreditar que têm responsabilidade sobre isso e querem pôr a culpa em alguém", argumenta.

Encruzilhada histórica
Segundo Marques, a Amazônia hoje está ameaçada por "toda uma arquitetura econômica que pretende dar lucros imediatos". "Ou nossa sociedade é capaz de reverter esse processo, ou vai causar consequências graves para a humanidade. Estamos em uma situação de encruzilhada histórica que vai definir o destino da humanidade dos próximos milênios", garante. 

Na avaliação de Cutrim, hoje, a maior esperança da Amazônia parece vir da pressão internacional. "Talvez isso mude com (a ação dos) países europeus. Inclusive porque eles fazem pressão com sanções econômicas e, quando dói no bolso, a postura melhora", analisa.

Com informações portal Correio Brasiliense

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