11 de julho de 2025

Lula sobre Trump: se diálogo falhar, haverá reciprocidade

Lula afirmou que convocará empresários dos principais setores afetados para pressionar os americanos (Foto: Ricardo Stuckert)

Em entrevistas ao Jornal da Record e ao Jornal Nacional, ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reafirmou que o Brasil não se curvará aos ataques de Donald Trump, que ameaçou taxar em 50% as exportações para os Estados Unidos, caso o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), não seja interrompido, e por causa de um “desequilíbrio comercial” entre os países — como imagina o presidente norte-americano. Segundo Lula, a carta endereçada a ele é “absurda” e atesta o total desconhecimento de Trump sobre o comércio bilateral de Brasil e EUA.

“Primeiro, vamos tentar negociar. Mas, se não tiver negociação, a Lei da Reciprocidade será colocada em prática. Se ele vai cobrar 50%, vamos cobrar 50% deles. A gente não tem medo”, frisou.

Mas, antes de recorrer à reciprocidade na taxação, Lula observou que há degraus a subir. Isso porque a taxação que Trump pretende impor é a partir de 1º de agosto e, desde que chegou à Casa Branca, ele fez ameaças de retaliação comercial — como ao México e ao Canadá — e recuou. Há a percepção no governo de que a reciprocidade é o recurso final.

“Se ele ficar brincando de taxação, vai ser infinita. Vamos chegar a milhões e milhões por cento de taxa. O que o Brasil não aceita é intromissão”, disse.

Grupo de trabalho

Lula afirmou que convocará empresários dos principais setores afetados pelo tarifaço para ajudar nas pressões junto aos compradores norte-americanos, na tentativa de fazê-los ver que também serão prejudicados. “Podemos recorrer à OMC (Organização Mundial do Comércio), propor investigações internacionais, cobrar explicações. Vamos criar uma comissão de negociação juntando empresários e o governo, ver quais são as decisões, quem é afetado, como vai ser afetado, como a gente pode procurar novos mercados. Pretendo reunir todos os empresários que têm exportação para os Estados Unidos, sobretudo aqueles que têm maior volume, para ver qual é a situação deles. O Brasil gosta de negociar. Depois que se esgotarem as negociações, vamos aplicar a Lei da Reciprocidade. Então, espero que (os empresários) estejam aliados ao governo. Porque se existe algum empresário que acha que o governo tem que ceder e fazer tudo que o presidente do outro país quer, esse cidadão não tem não tem nenhum orgulho de ser brasileiro”, cobrou.

Sobre o alegado deficit comercial dos EUA em relação ao Brasil, Lula afirmou que Trump desconhece a relação entre os países. “Em 2023, exportamos US$ 40 bilhões e importamos US$ 47 bilhões dos EUA. Tivemos um deficit de US$ 7 bilhões. E se somarmos os últimos 15 anos, o Brasil acumulou um deficit de US$ 410 bilhões com os americanos. Será que ninguém do Tesouro explicou isso para ele antes de escrever aquela carta absurda?”, questionou.

Segundo Lula, Jair Bolsonaro deve “assumir a responsabilidade” pelo tarifaço, pois o filho 03 do ex-presidente, o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), está nos EUA para “fazer a cabeça de Trump”. “O ex-presidente da República deveria assumir a responsabilidade, porque ele está concordando com a taxação do Trump ao Brasil. Foi o filho dele quem foi lá fazer a cabeça do Trump, que começa uma carta tentando fazer um julgamento de um processo que está na mão da Suprema Corte”, disse.

Para Lula, nas relações exteriores, ideologia não entra. “Converso com o presidente do país, seja ele quem for. Ele foi eleito pelo povo e precisa conversar. Agora, eu não tenho nada para conversar com o Trump. Aliás, ele não dá motivo para que a gente tenha algo para conversar. Temos tempo para ouvir os empresários, a OMC, outros países. E quando chegar o momento, que for necessário, não terei nenhum problema de pegar o telefone e ligar, correndo o risco de ele, de forma mal-educada, não me atender”, ironizou.

Além de defender o STF, o presidente disse que, no Brasil, da mesma forma como Bolsonaro, Trump seria julgado por ter incentivado a invasão do Capitólio, em 2021.

“Não dá para aceitar o presidente de um país importante como os Estados Unidos em uma carta para mim, publicada em um site, avocar o fim da ‘caças às bruxas’, em defesa para um ex-presidente que tentou dar um golpe neste país. Ele (Bolsonaro) não tentou dar um golpe: tentou preparar a minha morte, a morte do presidente do Tribunal Superior Eleitoral, à época o Alexandre Monais, a morte do vice-presidente (eleito Geraldo Alckmin). Quem vai ser julgado não é o cidadão Bolsonaro. Quem vai ser julgado são os autos do processo. Se ele tiver razão, será absolvido. Se não tiver, será condenado e preso. É assim que funciona a Justiça no Brasil. Aqui, é para todos, de verdade. Doa a quem doer”, afirmou.

Influência do clã

Para o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, o tarifaço é resultado da influência de aliados de Bolsonaro junto ao governo Trump. “Constatamos que o clã Bolsonaro trabalhou contra o Brasil mais uma vez. Quando governou o país, o ex-presidente trabalhou contra o Brasil na época do pandemia de covid, com mais de 700 mil mortos. No meio ambiente, aquele governo teve maior desmatamento já registrado. Do lado institucional, aquele governo tentou dar um golpe de Estado e, agora, mesmo estando fora do governo, o clã Bolsonaro ataca a economia prejudicando empresas e empregos”, acusou, após o evento do lançamento do Carro Sustentável.

Questionado sobre qual será a reação do governo brasileiro ao aumento de tarifa anunciado por Trump, Alckmin disse que essa atitude será pensada a partir de um grupo de trabalho. “O Brasil sempre esteve aberto ao diálogo e terá um comitê para tratar desse assunto”, acrescentou.

Entre os ministros, as manifestações são de que Trump atacou a soberania brasileira e que isso não deve ser tolerado. Uma das mais enfáticas foi Simone Tebet (Planejamento e Orçamento), que em publicação no X (antigo Twitter) disse que “é hora de diplomacia, de senso e de consenso, sim, na defesa do Brasil, mas é hora de fazermos isso juntos, unidos, como uma única família, deixando de lado as diferenças políticas e de ideologia, na defesa, intransigente, do nosso país”. E ainda alfinetou os bolsonaristas que fizeram manifestações favoráveis a Trump e colocando a culpa na crise no governo. “Isto, sim, é que é ser patriota. Dar luz e vida soberana ao Brasil, a favor dos brasileiros”, provocou.

Já o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também colocou o tarifaço na conta de Bolsonaro e do filho 03. “A única explicação plausível para o que foi feito ontem (quarta-feira) é porque a família Bolsonaro urdiu esse ataque ao Brasil, com um objetivo específico, que é escapar do processo que está em curso”, acrescentou o ministro.

Haddad afirmou, ainda, que é também o momento de todos — setor produtivo e agronegócio — estarem unidos. Segundo ele, empresários afetados pelo tarifaço americano estão procurando Lula em busca de solução por um problema, conforme o ministro, “criado por uma família”.

Publicado originalmente no Correio Braziliense

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