11 de novembro de 2022

Nem precisa ser bom, basta ser normal, por Érico Firmo

Lula ao deixar encontro com a equipe de transição em Brasília (Foto: Sergio Lima)

Os primeiros dias de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em Brasília após eleito foram de intensa agenda institucional. Encontra presidentes da Câmara dos Deputados, do Senado, reúne-se com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), com parlamentares da base aliada. Não há grandes novidades, nenhum grande anúncio. Sem confusão ou briga. Tudo muito protocolar, previsível. Chato até. Tudo muito monótono. E diferente do período de Jair Bolsonaro (PL) como presidente.

O governo que chega ao fim em 31 de dezembro é disfuncional, anômalo. Os gestos iniciais de Lula não têm nada demais. Não são propriamente bons. São apenas… normais. Previsíveis, chatos até. Aliás, o que houve de mais emocionante não foi exatamente bom. Disso falo a seguir.

A gestão de Bolsonaro é marcada por três anos e dez meses de imprevisibilidade, surpresas — invariavelmente negativas — atritos e postura errática do comando do governo. “Ah, o Paulo Guedes é do mercado…” O cartão de visitas dele foi arranjar encrenca com a Argentina, ainda em 2018.

Lula começa bem? Mal há algo a ser analisado. Indicações foram feitas apenas para a transição. Há quase nada de novidade em relação ao que foi sinalizado na campanha. Inclusive, é ruim que tão pouco se saiba sobre o que pretende o governo. Falou-se pouco na campanha, e isso é bastante negativo. Na segunda semana após a vitória eleitoral, quase nada se saber é pior ainda.

O que há de melhor na postura de Lula até agora é a normalidade, o tédio. Só isso é bem melhor que a adrenalina alucinada dos anos Bolsonaro.

Lula e a estabilidade fiscal

O que saiu da monotonia nesses primeiros dias de Lula foi suficiente para causar um alvoroço no mercado financeiro. O presidente eleito disse:

“Ora, por que as pessoas são levadas a sofrerem por conta de garantir a tal da estabilidade fiscal nesse país? Por que toda hora as pessoas falam que é preciso cortar gasto, que é preciso fazer superávit, que é preciso fazer teto de gasto? Por que as mesmas pessoas que discutem com seriedade o teto de gasto não discutem a questão social deste país? Por que o povo pobre não está na planilha da discussão da macroeconomia? Por que que a gente tem meta de inflação e não tem meta de crescimento? Por que que a gente não estabelece um novo paradigma de funcionamento neste país?”

Não vejo nada de propriamente chocante na fala. Não entendi que ele diga que não deve haver estabilidade fiscal. O que ele afirma é que essa estabilidade não pode ocorrer ao custo do sofrimento das pessoas. E que deve haver meta também em relação a isso. Não significa abandonar a outra — e não me parece que o sofrimento deva ser condição para o equilíbrio das contas públicas.

Seria um erro achar que a estabilidade causa sofrimento. Ao contrário. Instabilidade causa inflação, que corrói o poder de compra, e atinge sobretudo os mais pobres. Desequilíbrio provoca juros mais altos, o que é bom para especuladores e ruim para quem precisa de investimento público.

Bom, mas o fato é que, num momento de tão poucas sinalizações dadas pelo novo governo, qualquer indicativo contra o equilíbrio fiscal afeta a confiança do tal mercado. A forma como Lula comunicou não foi bem recebida, e não dá para culpar o receptor. O “mercado” não está reunido numa sala tomando decisões. São atores diversos, que colocam ou tiram o dinheiro conforme possibilidades de ganhar ou perder. Se for o seu dinheiro aplicado e você perceber que ele irá se desvalorizar, acredito que também irá tirar de lá rapidinho.

A fala de Lula é abstrata e não mostra o que será feito. É uma ideia. Quando o governo mostrar quais as ações a serem adotadas, tudo ficará mais fácil. Seria melhor ter feito isso na campanha.

Publicado originalmente no portal O Povo Online

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