13 de novembro de 2023

Mapas históricos e decretos do século XIX são usados em ação para Ceará não perder território para Piauí

Mapa entre o Ceará e o Piauí, com linhas de delimitação do campo do litígio (Foto: Divulgação/Ipece)

Na disputa judicial pela área de litígio na divisa entre o Ceará e o Piauí, grupo de trabalho organizado pela Procuradoria-Geral do Estado do Ceará (PGE) apresentou os argumentos que serão usados perante o Supremo Tribunal Federal (STF), na ação civil originária (ACO) 1831. O Exército realiza perícia técnica, determinada em 2016 pelo ministro do STF Dias Toffoli. A estimativa para conclusão, conforme o cronograma, é para maio de 2024.

O processo no Supremo foi movido em 2011 pelo Piauí, que requer 3 mil quilômetros quadrados do território cearense, atingindo 13 municípios do Ceará, 8 municípios do Piauí e uma população de cerca de 25 mil pessoas. A relatora do processo é a ministra Cármen Lúcia.

O grupo da PGE defende que os 13 municípios cearenses afetados pelo processo (Porangaba, Croatá, Tianguá, Guaraciaba do Norte, Ipueiras, Carnaubal, Ubajara, Ibiapina, São Benedito, Ipaporanga, Crateús, Viçosa do Ceará e Granja) devem permanecer no Ceará.

A partir da análise de mapas históricos, decretos e leis, a defesa cearense argumenta que "a divisa entre o Ceará e o Piauí corresponde às raízes (lado ocidental) da Serra da Ibiapaba, ficando esta serra integralmente para o Ceará".

A questão está relacionada à interpretação do Decreto Imperial 3.012, de 1880, que determinou a troca de dois territórios. O Ceará recebeu a então chamada Comarca de Príncipe Imperial (correspondente aos atuais municípios cearenses de Crateús e Independência. Em contrapartida, cedeu ao Piauí a região então conhecida como Freguesia de Amarração, correspondente aos atuais municípios piauienses de Luís Correia e Cajueiro da Praia.

Entre a área que o Ceará cedeu, ao norte, no litoral, e a que foi recebida,  mais ao sul, no sertão, existe a Serra da Ibiapaba, foco da divergência. A polêmica passa pela interpretação do tal decreto, no artigo 1. O entendimento do Piauí entende que parte da Serra da Ibiapaba pertenceria ao estado vizinho. A nota técnica do Ceará contesta.

Segundo a análise dos documentos, a divisão de que trata o decreto se refere apenas às regiões em que houve a troca, no litoral, ao norte, e sertão, ao sul. A Serra da Ibiapaba não teria relação com essa divisão e por isso permaneceu inteiramente no território cearense.

"Não obstante, esta interpretação, defendida pelo estado do Piauí, não está correta, haja vista que no artigo primeiro do Decreto Imperial nº 3.012 tem-se que a divisão das vertentes ocidentais e orientais deve ocorrer somente a partir do ponto do boqueirão do rio Puty, restringindo-se, dessa forma, a área da comarca de Príncipe Imperial. Ou seja, o artigo 10 do decreto alterou os limites entre os dois Estados somente na área anexada ao Ceará", diz a nota técnica.

Acordo frustrado

Ainda é citado o Convênio Arbitral de 1920, apesar de ser uma carta de intenções sem validade jurídica. Nele é determinado que os estados deveriam ter posse das cidades, vilas e povoados já estabelecidos até a decretação imperial em 1880.

Neste período, a região já estava estabelecida no Ceará, na época divididos apenas em três municípios: Viçosa do Ceará, de 1759, Granja, de 1776, e Guaraciaba do Norte, de 1791.

“Portanto, de acordo com as disposições deste convênio, fica claro que as áreas em disputa pertencem ao Ceará, uma vez que o Estado tem administrado esses territórios desde antes da promulgação do Decreto Imperial de 1880”, defendeu a nota técnica.

IBGE e a posição favorável ao Ceará

O documento ainda afirma que em 2012, durante ação de conciliação entre o Ceará e o Piauí, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) realizou trabalho técnico para a delimitação da divisa em uma área inicial, nos municípios de de Poranga e Pedro II (PI). O resultado divulgado foi favorável ao Ceará, mas o governo piauiense se retirou da conciliação.

Já em 2013, a lei estadual nº 6.404 do Piauí, que delimita o território piauiense, reconheceu a divisão realizada pelo IBGE. No ofício é determinado os limites para a execução do decreto, indo até o município de Cocal dos Alves, que faz divisa com o Ceará.

Perícia do Exército

Um novo relatório técnico, desta vez realizado pelo Exército Brasileiro, está em produção. Os peritos do estiveram em setembro e outubro na área disputada e contaram com a presença de representantes do Ceará e do Piauí. A instituição prevê a conclusão do material em maio de 2024.

Os militares já tinham realizado outro relatório da situação em 2016, em que aumentavam a área do litígio. Em 10 de julho deste ano, a instituição informou que o documento deveria ser utilizado apenas para fins orçamentários.

Para o procurador-geral do Estado do Ceará, Rafael Machado, o próximo passo no caso é apresentar o estudo ao Supremo Tribunal Federal. Ainda não está definido se isso será feito antes ou depois de o laudo técnico do Exercito ser apresentado.

“Estamos no aguardo do laudo final da perícia, estamos acompanhando, claro que vamos apresentar esses dados justamente para que a perícia possa ser subsidiada, queremos definir estrategicamente o momento para apresentação desses elementos, se antes ou após a realização da perícia”, explicou.

“A depender do resultado da perícia, nós esperamos, pelo que foi visto, de forma muito clara, que seja favorável ao Estado do Ceará”, avaliou, mas acrescentou que o governo também possui outras estratégias de defesa, uma delas, um pedido de relatório do IBGE.

Machado ressaltou que o Ceará, além da análise dos mapas históricos entre os dois estados, também se propõe a discutir o pertencimento dos cidadãos, e como essa possibilidade de alteração na divisa pode alterar o cotidiano da sociedade.

“Queremos que fique claro no processo para o Supremo Tribunal, para todos os ministros, esse sentimento de pertencimento, se a perícia do Exército não deixar claro e evidente o interesse e o direito da população cearense ao território, iremos sim solicitar um estudo mais amplo do IBGE, para que assim fique claro”, acrescentou.

"Não estamos discutindo posses de terras, mas vidas que serão diretamente afetadas”, comentou e acrescentou que é “evidente que os 13 municípios pertencem ao Ceará” e que a perspectiva é de "vitória".

Para além do impacto social, a eventual perde de território cearense pode ter elevado impacto no PIB agrícola do Estado.

Além da Procuradoria-Geral do Estado, compõem o grupo de trabalho, o Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece), a Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh), a Controladoria e Ouvidoria Geral do Estado (CGE), a Fundação Universidade Estadual do Ceará (Funece), o Instituto de Desenvolvimento Agrário do Ceará (Idace), a Secretaria do Desenvolvimento Agrário (SDA) e a Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace).

Com informações portal O Povo +

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