4 de abril de 2021

Adauto Bezerra: o último dos coronéis e a memória do ciclo dos militares

O ex-governador do Ceará, Adauto Bezerra, morreu aos 94 anos por Covid-19 (Foto: Ethi Arcanjo)

Com sua morte nesse sábado, 3, o ex-governador Adauto Bezerra leva consigo uma parte considerável da história do ciclo político cearense. Dono de diversos mandatos eletivos, Coronel Adauto, como era conhecido, é personagem chave da máquina coronelista vigente no Estado. Em função das bênçãos dos generais de Brasília durante o regime militar, ainda no contexto de eleições indiretas para governos estaduais, manteve o auge de sua influência naquele período.

Adauto inicia sua trajetória com um padrão bastante inusual, a ida para a carreira militar mesmo pertencendo a uma família tradicional do Cariri, radicada no sul do Ceará desde o século XVIII. Ele ingressou na Escola Militar do Realengo, no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, em fevereiro de 1943, sendo declarado aspirante a oficial da arma de artilharia em dezembro de 1949.

Segundo o historiador e escritor cearense Airton de Farias, o fato de um membro de uma família tradicional - conhecida como grande produtora ligada ao comércio de algodão - escolher a trajetória militar é algo "incomum na história do Ceará". 

"Isso é algo diferente porque existe, por parte de uma elite brasileira, inclusive ainda hoje, um certo desprezo e desdém pela vida militar. Geralmente a carreira militar é direcionada por pessoas da classe média", destaca.

Filiado à Aliança Renovadora Nacional (Arena), Adauto começa a ocupar cargos eletivos. Na legenda, elege-se deputado estadual em novembro de 1966. Ao longo de três legislaturas, foi presidente da Assembleia Legislativa por duas vezes, da Comissão de Orçamento e Finanças e de diversas outras comissões da casa. Em 1970, já com a patente de coronel, foi reconduzido para mais um mandato, concluído em 1975.

Tem início então o auge da influência dos "generais de Brasília" na política cearense. Indicado ao posto em maio de 1974 pelo presidente da República, general Ernesto Geisel, por eleições indiretas, Adauto torna-se governador do Ceará. A partir daí, segundo Airton, imersa na tríade coronelista, a gestão deflagra um processo de "modernização conservadora".

"No geral, apostaram na indústria e em grandes obras de infraestrutura, embora mantendo as práticas políticas mais tradicionais", lembra o historiador.

A época, destaca o escritor, também é lembrada pelo constante uso de práticas políticas muito questionáveis, como o clientelismo, apadrinhamento e violência políticas.

"O Ceará 'se modernizava', mas as práticas políticas continuaram muito conservadoras", avalia Airton. O modelo de gestão era executado "de costas para o mar", ou seja, para o sertão.

É nesse sentido que o ex-governador é referido pelo seu poder de cooptação diante das lideranças políticas cearenses. Além de manter diálogo com o Planalto, o governador conservava, em semelhante aos demais coronéis, determinados grupos de comando, entre eles prefeitos e deputados.

"É chamado de acordo dos coronéis. Eles tinham divisões e disputas, mas os três comandavam o Ceará", conclui o escritor.

Para o cientista político Cleyton Monte, o ex-governador será lembrado por saber trabalhar sua articulação política no sentido de mobilizar recursos para o Ceará.

Adauto em evento com o senador Tasso Jereisati (Foto: Fabio Lima)

"O Adauto vai ficar na história política como uma figura de nome e de destaque, justamente porque simboliza um articulador político da era dos coronéis. Era um político que conseguiu desenvolver uma série de programas dentro da gramática política daquela época", avalia.

Com informações portal O Povo Online

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