11 de abril de 2023

100 dias de Lula: as críticas e elogios de personalidades que "fizeram o L"

Eleitores de Lula em 2022, Felipe Neto, Tabata Amaral e Celso de Mello se dividem entre críticas e elogios ao início da gestão petista (Foto: Reprodução/Facebook/Twitter)

O bordão "faz o L" marcou o apoio ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas redes sociais, entre personalidades e pessoas comuns, durante as eleições. A adesão de eleitores que nunca haviam apoiado o PT ou que andavam distantes do partido permitiu ao petista conquistar uma vitória apertada sobre o então presidente, Jair Bolsonaro (PL).

Com o início do governo, o "faz o L" passou a ser usado tanto para exaltar quanto para criticar o terceiro mandato de Lula, ora associado a possíveis realizações positivas, ora a possíveis notícias negativas.

Cem dias depois da posse presidencial, a BBC News Brasil ouviu personalidades de diferentes áreas que declararam apoio a Lula, como o comunicador e influenciador digital Felipe Neto, a deputada federal Tabata Amaral e o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello para saber o que veem de positivo e negativo nesse início de governo.

No final de março, chamaram atenção as duras críticas do escritor Paulo Coelho, que chamou o governo de "patético" em seu Twitter e mostrou arrependimento por ter se empenhado na campanha.

Já personalidades ouvidas pela reportagem mostraram certa decepção em algumas áreas, como economia ou alianças políticas, mas estão longe de manifestar arrependimento por seu voto.

Nesse público, predomina um forte sentimento de rejeição a Bolsonaro e a ideia de que apenas Lula conseguiria evitar sua reeleição.

"Jamais me arrependerei, pois do outro lado era o fascismo de Jair Bolsonaro. Qualquer pessoa que tente nivelar os dois é mau caráter ou desinformada", respondeu Felipe Neto à BBC News Brasil, que era ferrenho crítico do PT anos atrás e se engajou na campanha de Lula em 2022.

A pedido da reportagem, o influenciador listou o que vê de positivo e negativo nesse início de mandato, fazendo antes a ponderação de que se passaram apenas três meses, "um tempo absolutamente minúsculo, ainda mais considerando que pegou uma herança maldita".

Na sua visão, "a urgência para a questão dos massacres indígenas era absoluta e isso está sendo prioridade, o que é excelente".

"A recriação do Bolsa Família, as restrições de acesso à armas e munições, (relançamento do) Minha Casa Minha Vida, resgate das relações externas, suspensão do Novo Ensino Médio, freio nas privatizações, volta do Fundo Amazônia, volta de investimento nas Bolsas de Pesquisas. Todos esses foram golaços da gestão até agora", disse ainda.

Por outro lado, apontou como erros as escolhas dos ministros do Turismo (Daniela Carneiro) e das Comunicações (Juscelino Filho), ambos do União Brasil. Ela é acusada de ter elos políticos com milicianos e ele, de embolsar diárias indevidamente durante viagens particulares. Ambos rejeitam as acusações.

A ministra, acusada de ter recebido apoio de milicianos em sua campanha para deputada federal em 2018 e 2022, alega que foram muitos apoios em diferentes cidades do Rio de Janeiro e que não compactua com qualquer apoiador que porventura tenha cometido algum ato ilícito.

Juscelino Filho, por sua vez, alegou ter havido um erro ao registrar as diárias e devolveu os valores recebidos indevidamente. "Foram escolhas tristes buscando acordos com o centrão, única forma de governar o país", lamentou Neto.

"Também considero um erro abandonar a lista tríplice, mesmo compreendendo os motivos por trás disso", acrescentou, em referência à sinalização de Lula de deixar de nomear como Procurador-Geral da República um dos eleitos pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR).

O petista inaugurou em seu primeiro mandato essa tradição, que foi rompida por Bolsonaro com a escolha de Augusto Aras. Para defensores da lista tríplice, isso reduziu a independência da PGR no governo passado.

Outra crítica de Neto é à comunicação do presidente, que "continua muito ruim". O caso que gerou mais repercussão negativa nos cem primeiros dias foram as falas de Lula envolvendo o senador Sergio Moro (União Brasil-PR).

O presidente primeiro disse que durante o tempo que esteve preso em Curitiba nutria sentimentos vingativos contra Moro, que o condenou em processos da Lava Jato quando era juiz. Essas decisões foram mais tarde anuladas pelo STF, que considerou que Moro não agiu com imparcialidade nos casos do petista.

Depois, Lula gerou ainda mais críticas ao sugerir sem provas que ameaças da organização criminosa PCC contra o senador combatidas por uma operação da Polícia Federal seriam uma "armação" do ex-juiz. Na ocasião, Neto disse que a fala era "péssima" e havia servido apenas para fortalecer Moro.

Foi justamente essa declaração de Lula que gerou a revolta de Paulo Coelho, assim como as pressões do governo para o Banco Central reduzir a taxa básica de juros, algo que tem incomodado também economistas liberais que votaram no petista, como Armínio Fraga e Henrique Meirelles.

"Décadas apoiando @LulaOficial, noto que seu novo mandato está patético. Cair na trampa de ex-juiz desqualificado, incapacidade de resolver problema do BC, etc. Não devia ter me empenhado na campanha. Perdi leitores (faz parte) mas não estou vendo meu voto ter valido a pena", escreveu o escritor na rede social, no final de março.

Apesar das críticas dos economistas liberais, pesquisa Datafolha mostrou que há grande apoio popular à atuação de Lula nesse tema. Segundo levantamento do final de março, 80% dos entrevistados avaliam que o presidente age bem ao pressionar pela redução da taxa de juros. Apenas para 16% ele age mal.

Questionada sobre as críticas, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República defendeu o debate público respeitoso.

"A atual gestão do governo brasileiro está completando 100 dias de um mandato de 4 anos para qual foi eleita nas urnas. Ouvimos, respeitamos, dialogamos e não ofendemos ninguém por discordâncias pontuais, eventuais ou mais gerais, porque defendemos a democracia, a livre expressão e o debate público respeitoso, com liberdade e troca de ideias", respondeu o órgão.

A decepção de quem já esperava pouco

Se Paulo Coelho perdeu leitores, o empresário João Amoêdo abriu mão do partido que fundou, o Novo, ao decidir apoiar Lula no segundo turno da eleição.

Apesar das suas profundas críticas aos governos petistas, Amoêdo declarou voto no atual presidente por considerar que a reeleição de Bolsonaro seria uma "ameaça à democracia". Depois, acabou se desfiliando do Novo, que manteve uma proximidade com o bolsonarismo.

À BBC News Brasil, o empresário disse que não esperava um governo alinhado com sua agenda — o PT, por exemplo, valoriza o papel de um Estado maior na redução das desigualdades e promoção do crescimento, enquanto economistas liberais como Amoêdo consideram que o setor privado é mais eficiente para gerar desenvolvimento.

Apesar de estar ciente dessas diferenças, considera que os primeiros cem dias foram piores do que ele imaginava. "Era cético em relação à gestão do Lula pelas ideias equivocadas do PT, especialmente quanto á gestão da economia, mas considera a hipótese de que Lula poderia fazer uma gestão mais parecida com o Lula 1", contou.

"Infelizmente o que ele tem demonstrado até agora é que optou pelo modelo (do governo) Dilma (Rousseff), que foi um desastre. Nesse sentido, está sendo bem pior do que o esperado. A quantidade de erros e a falta de humildade do presidente são preocupantes", critica.

Para Amoêdo, "a grande maioria das pautas do presidente são um retrocesso para o país", como "os ataques ao BC, a ideia de reestatização da Eletrobrás, o conceito de trazer de volta o BNDES para subsidiar empresas, a alteração do Marco do Saneamento, entre outras".

De positivo na economia, citou apenas o fim da desoneração nos combustíveis. Já na escolha da equipe ministerial, considerou "um avanço" a nomeação para alguns ministérios, como Educação (Camilo Santana), Meio Ambiente (Marina Silva), Justiça (Flávio Dino) e Relações internacionais (Mauro Vieira).

"Não me arrependo do voto, pois era um voto contra a permanência de Bolsonaro. Por todo o risco que ele representava para a democracia e para as instituições sua reeleição era, na minha avaliação, inaceitável", disse também à reportagem.

'Volta à normalidade'

A deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP) não foi uma entusiasta de primeira hora da candidatura de Lula, por não considerar que o petista seria capaz de "unir o país".

Preferia um representante da terceira via e, antes de a campanha começar de fato, chegou a manifestar apoio a nomes como Simone Tebet (MDB), que disputou o primeiro turno, e Eduardo Leite (PSDB), que acabou se candidatando (e sendo eleito) para governar novamente o Rio Grande do Sul.

No entanto, como nenhum outro candidato despontou com chances reais de vencer Bolsonaro, anunciou em julho seu voto em Lula já no primeiro turno.

"De maneira alguma me arrependo e não acredito que me arrependerei em nenhum momento da minha vida", disse à BBC News Brasil sobre ter apertado o 13 na urna.

"Para mim, sempre esteve muito claro o que Bolsonaro representava. A corrupção, a falta de humanidade, a postura dele durante a pandemia, a ameaça autoritária constante, que se não fosse do jeito dele, como ele queria, as regras seriam mudadas", reforçou.

Tabata diz que não concorda nem vai concordar com tudo em qualquer governo, mas celebra o que vê como "a volta de um sentimento de normalidade" na gestão Lula.

Cita como exemplo a atitude do presidente de atuar em parceria com seu adversário político, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), no enfrentamento aos danos causados pelas enchentes no litoral paulista no início do ano. Ou a retomada do diálogo entre o Executivo e o Congresso em pautas importantes como a Reforma Tributária.

"(A volta à normalidade) É a gente poder conversar", explica. "Quando, enfim, existe um debate, o executivo dialogar de fato com o Congresso sobre essa temática. Quando existe um questionamento (do parlamentar), ele poder ser feito a um ministro, ele poder ser feito a um secretário, e por aí vai", continua, lembrando a falta de abertura do antigo governo.

'Predomínio da luz sobre as trevas'

O ex-presidente do STF e ministro aposentado Celso de Mello é outro que mantém forte apoio a Lula, sobretudo ao comparar o atual governo com a gestão Bolsonaro. Após deixar a Corte, ele declarou seu voto no petista.

Quando ministro, Mello atuou com dureza no julgamento do escândalo do Mensalão, que marcou o primeiro mandato de Lula. Na Lava Jato, ora se alinhou aos ministros mais favoráveis à operação, ora aos mais garantistas.

À BBC News Brasil, respondeu que a atuação de Lula "mostra-se positiva" nos cem primeiros dias. Na sua avaliação, o governo "vem traduzindo, em gestos expressivos (e concretos), a proteção da ordem constitucional".

"Numa simples análise comparativa com a Administração que o precedeu, o governo Lula (a) representa o predomínio da luz sobre as trevas, (b) o primado do regime democrático sobre veleidades de inspiração autocrática, (c) a hegemonia do conhecimento, da cultura e do pensamento científico sobre uma inaceitável concepção de mundo e o mais profundo negacionismo, (d) o prevalecimento das virtudes republicanas sobre um governante desprovido de ‘statesmanship’ [um político com experiência e respeitabilidade] e, o que é gravíssimo (e indigno), apologista declarado da tortura, (e) a reafirmação do compromisso irrenunciável com a diversidade e com políticas inclusivas de Estado, a significar, como natural consequência dessa visão iluminista (e progressista), frontal rejeição a qualquer espécie de discriminação e de preconceito de classe, de etnia, de origem, de gênero, de orientação sexual e de religião, entre outros tipos aberrantes de exclusão arbitrária e seletiva"escreveu à reportagem.

Com informações portal Correio Braziliense

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