9 de abril de 2019

A fake news do presidente por Érico Firmo


Na noite de 27 de março, a jornalista Eliane Cantanhêde anunciou que a decisão estava tomada: Jair Bolsonaro (PSL) havia batido o martelo sobre a demissão de Ricardo Vélez. De imediato, o presidente se fez de vítima e falou que sofre fake news. Aquele seria o caso. Não era. O presidente mentiu e usou a mentira para atacar a jornalista.

Cantanhêde disse na Globonews: "É uma questão de tempo. Pode ser em horas, pode ser em dias". Repare que ela não disse que ele estava demitido naquele momento, mas que Bolsonaro havia tomado a decisão de demiti-lo e o faria. A informação se mostrou correta. Bolsonaro deu razão a ela. A fake news acabou sendo do presidente.

A guerra contra a imprensa

Bolsonaro segue a cartilha Donald Trump em várias coisas e o enfrentamento à imprensa é um dos pilares. A estratégia é desacreditar todos aqueles de onde podem vir críticas. Fazem isso com a oposição e com a imprensa.

A quem quer ajudar Bolsonaro, é importante saber: mais ajuda quem critica que quem bajula. Fechar os olhos aos erros não ajuda nem nunca ajudou. Bolsonaro tem cometido erros. O MEC estava uma bagunça e até o presidente se convenceu disso, ainda que muitos apoiadores não enxergassem. Varrer para debaixo do tapete só acumularia a imundície para um futuro próximo.

A gestão Vélez ficou marcada por anunciar medidas e recuar depois. Desconheço ação importante anunciada e mantida. Os recuos foram o que fez de melhor. Os erros que deixou de cometer são seu legado.

O tempo decorrido

Que Vélez não tinha condição de permanecer no cargo havia ficado claro nos primeiros dias de "gestão". Ele não bateu o recorde de Cid Gomes, que saiu após 77 dias. Vélez saiu no 98º. Mas ninguém bate o mais recente ex-ministro em quantidade de trapalhadas. Ele ganhou sobrevida porque Bolsonaro não queria dar razão a Cantanhêde. Queria mais um elemento na sua briguinha besta com a imprensa. Só conseguiu atrapalhar mais seu governo - deu tempo a Vélez de fazer ao menos mais uma bobagem. No fim, o presidente deu razão à jornalista.

Alguns dos simpatizantes de Bolsonaro foram às redes sociais dizer que uma coisa nada tem a ver com a outra. Ora: a jornalista anunciou a demissão no dia 27. Em 5 de abril, Bolsonaro deu o indicativo de que iria demitir o ministro. Entre uma coisa e outra foram nove dias. Sem fato novo, segundo o porta-voz. As pessoas acham mesmo que uma coisa não tem a ver com a outra?

Alguém acha que Bolsonaro estava convicto de que iria manter Vélez em uma semana e, na semana seguinte, decidiu demiti-lo do nada? Sem fato novo, como confirmou o porta-voz. Sério que as pessoas acreditam nisso?

O discurso chapa branca

Algumas pessoas questionaram - a que ponto chegamos - Cantanhêde por dar a informação quando ainda não era confirmada, não era oficial. Ela noticiou uma tomada de decisão. Saiu de alguma reunião ou confidenciada a alguém. Isso é um fato. Esperar que só aquilo que é oficial seja notícia é levar ao ápice o chapa-branquismo. As notícias mais importantes são aquelas que os governantes não querem que saiam. E, sabe de uma coisa, quem hoje espera que a imprensa só publique o que é oficial certamente não queria o mesmo, por exemplo, no governo Lula. Assim como quem reclamava do criticismo da imprensa com Lula espera todo rigor na cobertura sobre Bolsonaro.

Quem hoje é poder amanhã será oposição. É o jogo da democracia. Uma imprensa crítica e vigilante é uma garantia para todos, que podem estar no poder, mas um dia estarão fora. Passa mais rápido do que os governantes imaginam.

Publicado originalmente no portal O Povo Online


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